quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Artes - I

CONTRIBUTO
PARA UM
PROGRAMA DE INICIAÇÃO AO
DESENHO EM
DOIS
ANDAMENTOS
.

Principalmente chamo DESENHO aquela ideia criada no entendimento criado, que imita ou quer imitar as eternas e divinas ciências incriadas, com que o muito poderoso Senhor Deus criou todas as obras que vemos,
e compreende todas as obras que têm invenção, ou forma, ou fermosura, ou proporção, ou que a esperam de ter, assim interiores nas ideias, como exteriores na obra; e isto baste quanto ao Desenho.
Francisco de Holanda
.
.
.
PROPÓSITO

O mundo é todo o tangível e o inteligível ao alcance do homem.
Neste mundo que nos é dado viver, todo o sensível que se nos depara, ou é anterior ao homem e dele não depende, ou é posterior ao homem e dele pendente. Ali vemos a natureza, aqui a arte; esta imita aquela. Toda a arte é análoga à natureza. Só pela filosofia, pela arte ou pela religião, o homem compreende o mundo.

E se a arte é uma árvore frondosa cujas antigas e principais ramificações são o canto, a música, a dança, a pintura, a escultura, a arquitectura, o teatro, a literatura e a poesia, a partir das quais emanam todas as outras menores artes, o desenho é o seu portentoso e pujante tronco. É pela degradação do desenho que a evanescência da arte contribui para a desolação actual do mundo, pelo que se torna imperioso reabilitar o desenho no ensino das artes. Neste sentido procuramos contribuir com um programa genérico destinado ao desenvolvimento e aprendizagem do desenho no ensino das artes. Ao mestre interessado e responsável caberá a adaptação de metodologia, e a aplicação e o uso dos meios que entender mais adequados a fazer desabrochar no aprendiz a expressão livre da sua visão e do seu conhecimento.

Pretende-se que pela actividade que o desenho supõe, o aprendiz desenvolva as suas capacidades especulativas, ou de entendimento, compreensão e reflexão de imagens.
Queremos significar a imagem como a expressão, na mente, de uma ideia, portanto “cosa mentale” segundo a expressão consagrada. Diz-se da ideia o que em cada indivíduo se anuncia como original e que o motivará no sentido da verdade. O entendimento corresponderá à possibilidade, abertura e capacidade, em cada indivíduo, para a formação de uma ideia; a fixação, a articulação e a concentração dos dados para a possível definição da ideia, a isso chamamos compreensão; à projecção, configuração e materialização da imagem chamamos reflexão. O desenvolvimento destas três actividades processar-se-á gradativa e organicamente do entendimento até à reflexão, não sendo, pois, possível a reflexão sem a compreensão, nem a compreensão sem o entendimento. Neste sentido o entendimento é um dom. A este acto que pressupõe uma duração temporal, chamaremos especulação; à actividade perene de que esse acto depende e se suporta chamaremos pensamento. No pensamento artístico a matéria será o sensível que finalmente pode admitir, moldar e abrigar a ideia na forma de imagem, pois as imagens é que são o conteúdo desta disciplina. Neste sentido, advém como objectivo da aplicação deste contributo programático habilitar o aprendiz com as técnicas de representação ou de desenho que lhe sejam acessíveis.

DESENVOLVIMENTO

O programa de desenho será desenvolvido em dois andamentos sucessivos: o primeiro, Desenho I, tratará da compreensão das formas da natureza, a fim de habilitar o aprendiz a imaginar as realidades que o cercam; o segundo, Desenho II, tratará da compreensão das formas da arte, tendo como finalidade e em sucessão articulada com o andamento anterior, habilitar o aprendiz a conhecer as representações que essas realidades tiveram na história das artes.
.

PROGRAMA

Desenho I

Motivo

Compreensão das formas da natureza, em desenvolvimento gradativo, do mais bruto ao mais sublime.

Unidades Temáticas

São quatro as unidades temáticas a desenvolver na seguinte sucessão:

1ª Estudo dos Minerais;

2ª Estudo dos Vegetais;

3ª Estudo dos Animais;

4ª Estudo do Homem.

Para cada ente dado a estudar em cada uma das unidades temáticas, será desenvolvida uma abordagem às suas seguintes características:

- Medida (sua extensão no real);

- Proporção (relação de medidas em si e com o exterior);

- Luz (ilusões, sombras e cores);

- Inserção (situação de emergência na natureza);

- Desenvolvimento (movimento e adaptação à natureza);

- Destino (possíveis consequências naturais ou artificiais).

Para cada ente dado a estudar em cada uma das unidades temáticas, o aprendiz poderá ser estimulado a organizar a sucessão da sua abordagem pela ordem seguinte:

1º - Procura – Período em que irá dar-se a definição progressiva da ideia inerente àquilo que está em estudo, por meio de registos introvertidos;

2º - Objectividade – Período adequado á projecção e exposição conclusiva do que estudou, por meio de registos extrovertidos que permitam uma leitura objectiva do que se pretende expressar;

3º - Subjectividade – Período correspondente à projecção e exposição conclusiva do que estudou, mostrando uma perspectiva subjectiva do que se pretende.

Desenho II

Motivo

Compreensão das formas da Arte enquadradas nos diversos géneros artísticos e considerando as respectivas obras como imagens no sentido que definido nas palavras de introdução. Este andamento do curso segue como complemento de Desenho I.

Unidades Temáticas

Consideremos nove géneros artísticos e a cada um façamos corresponder uma unidade temática. Assim, sendo as seguintes as nove unidades temáticas deverão as mesmas desenvolver-se na sucessão que também segue:

1ª - Estudo do Canto;

2ª - Estudo da Música;

3ª - Estudo da Dança;

4ª - Estudo da Pintura;

5ª - Estudo da Escultura;

6ª - Estudo da Arquitectura;

7ª - Estudo do Teatro;

8ª - Estudo da Literatura;

9ª - Estudo da Poesia.

Pretende-se pois que o aprendiz seja estimulado a descobrir as regras possíveis para a elaboração das obras em cada uma destas artes, com especial relevo para aquelas em que a representação é visual; será estimulado a descobrir como a matéria ou o sensível, especialmente o visual, condicionam a obra de arte; e ainda a descobrir as regras desse condicionamento.

Sem comentários: